As ruas e rodovias são um ambiente onde os motoristas se encontram a todo instante e, por esse motivo, o índice é alto. “Há um número grande de pessoas convivendo e se sujeitando aos riscos, basta ver o que acontece nos feriados”, analisa Marcelo Araújo, presidente da Comissão de Trânsito da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR) e professor do Unicuritiba.
Apesar dos números assustadores, é preciso fazer uma ressalva: entre 1992 e 2007, o índice de mortes no trânsito saltou de 18,3 para 20,3 a cada 100 mil habitantes – crescimento de 11%. En quanto só no Paraná a frota de veículos subiu muito mais em um curto período de tempo: o aumento foi de 35% entre janeiro de 2007 e julho de 2010, saltando de 3,7 milhões para quase 5 milhões de automóveis. Esse cenário se repete em todo o Brasil.
Causas
Entre especialistas, o mau comportamento é apontado como responsável pelas ocorrências e consequentes óbitos, sobretudo de pedestres. Indicar, no entanto, os motivos que levam os motoristas e transeuntes a desrespeitar as leis não é tão simples.
Não são os carros ou as estradas os responsáveis pelos acidentes: nove em cada dez atropelamentos ou colisões são causados por erros dos motoristas, segundo as estatísticas do Detran-PR. “Costumamos dizer que o acidente é uma infração que não deu certo”, afirma a coordenadora de Educação para o Trânsito do Detran-PR, Maria Helena Gusso Mattos.
A diretora de trânsito de Curitiba, Rosângela Battistella, analisa que muitos condutores encontram na direção uma válvula de escape para enfrentar seus problemas. “Às vezes, uma pessoa calma e serena não consegue lidar com o trânsito e não percebe que o carro é uma arma”, opina.
Segundo a psicóloga especialista em trânsito Adriane Picchet to Machado, estudos psicológicos mostram que, quando não se sentem em perigo, as pessoas se descuidam e esquecem de dar atenção à própria segurança. Outros dois fatores que favorecem o cometimento de infrações são o anonimato do motorista e a relação de poder dele com a máquina. “É como se o condutor tivesse no trânsito a possibilidade de cometer erros sem se revelar, ainda mais com vidros escuros”, diz.
Educação e fiscalização
A solução, então, para os problemas vividos no trânsito passa necessariamente pela educação do motorista, o que acontece com conscientização ou fiscalização. As câmeras e radares no trânsito evitam ocorrências, por exemplo. “Quanto mais vigilância, mais as pessoas são forçadas a andar nos limites”, diz o engenheiro elétrico especialista em trânsito e diretor de Negócios Internacionais da Perkons, José Mario de Andrade.
Na avaliação de Maria He lena, a mudança de comportamento ocorre de forma gradativa, com a conscientização por meio de campanhas e fiscalização. Enquanto isso, a fiscalização se transforma em meio de ensinar.
Para educar desde cedo, há quem defenda a inclusão da disciplina sobre trânsito na escola ou a inserção do trânsito no currículo escolar. Conforme o Denatran, o Ministério da Edu cação trata o trânsito como tema universal e não disciplina obrigatória. Por isso fica a critério das escolas decidirem se tratam do assunto, seguindo normas estabelecidas pelo Contran.
Parentes de vítimas ficam com sensação de impunidade
Para quem perde alguém no trânsito, a sensação, muitas vezes, é de impunidade. A maior parte dos homicídios de trânsito, porém, são considerados culposos (quando não existe a intenção de matar). Apenas em exceções o condutor é indiciado pelo dolo eventual (quando assume o risco de matar). “Nos homicídios comuns, há a intenção de matar. Tradicional mente, no trânsito, você não encontra a pessoa que joga o carro em cima de alguém para cometer homicídio”, esclarece Marcelo Araújo, presidente da Comissão de Trânsito da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Paraná (OAB-PR).
Falta consciência
Na maior parte dos acidentes, a imprudência, a negligência ou a imperícia estiveram presentes. Isso acontece, na avaliação de Araújo, não pela falta de punição, mas pela falta de consciência de condutores e pedestres. “Isso só vai acontecer com o trabalho de base, focando em comportamento”, diz. Essa batalha precisa ser encampada pela sociedade: “Por que ninguém mais fuma em vários lugares? Alguém sabe o valor da multa por fumar em lugar público? A própria sociedade impôs esse comportamento e precisa fazer o mesmo com o trânsito”, diz.
No alvo, as mortes no trânsito
Ao lado de Palmas, Belo Hori zonte, Campo Grande e Teresina, Curitiba é uma das cinco cidades selecionadas pela Organização Mundial de Saúde e Fundação Bloomberg para integrar o projeto Vida no Trânsito, cujo objetivo é diminuir as mortes nas ruas a partir do ano que vem até 2020. Para isso, a fundação vai destinar verbas para prestar consultoria aos municípios. O diretor de Promoção à Saúde da Secretaria Municipal de Saúde, Antonio Silveira Filho, afirma que Curitiba foi escolhida pelo programa com o intuito de melhorar as ações intersetoriais com o estado e o governo federal. “Curi tiba é reconhecida pela boa análise de dados do trânsito, com a produção de boletins epidemiológicos. Também é notória pelas garantias de melhoria da mobilidade urbana”, diz. Além do Brasil, outras nove nações foram selecionadas para participar do projeto: Rússia, Turquia, China, Camboja, Egito, Índia, Quênia, México e Vietnã.
Estatística
Apesar dos 30,4 mortos a cada 100 mil habitantes, o Paraná, especialmente Curitiba, tem controle maior dos acidentes e mortes ocorridos no trânsito. “Pode ser que, em outros estados, as pessoas estejam morrendo mais, mas não há informação”, avalia Rosângela Battis tella, diretora de Trânsito de Curitiba
Depoimento
“Ela morreu de forma estúpida”
Mônica Cristina Bonetto Santos, dona de casa que teve a mãe atropelada na calçada, em janeiro deste ano.
Foi em uma manhã de sábado que a dor da perda e humilhação invadiu meu lar [quando a mãe de Mônica, Sueli, 54 anos, foi atropelada na calçada às 9 horas da manhã por uma motorista bêbada]. Nossas leis brandas dizem ser uma fatalidade, um homicídio culposo [quando a pessoa não tem intenção de matar]. Qual intenção, então, teria alguém que pega a direção de um automóvel sem saber dirigir e embriagada?
A partir do momento que você infringe as leis, você deve ser responsabilizado por seus atos. Até quando teremos que enterrar pessoas que amamos por culpa de pessoas que não têm respeito à vida? Que direito de Justiça tem uma família destruída por uma atitude dessa? Infelizmente, nenhum.
2010 é ano de eleições. Está aí uma oportunidade para os candidatos realmente fazerem algo, porque no Brasil muito se fala e pouco se faz. A lei seca absolve quem refuta o bafômetro. O que esperar de leis assim? Minha mãe, uma mulher que lutava todos os dias pela vida [fazia hemodiálise], se foi de uma forma estúpida. Nunca pensei que isso fosse acontecer comigo. Peço a todos que se conscientizem: quando for dirigir, perceba que o carro não é só um meio de transporte e sim uma arma potencial, que tem tirado a vida de muitos inocentes.
Apesar dos números assustadores, é preciso fazer uma ressalva: entre 1992 e 2007, o índice de mortes no trânsito saltou de 18,3 para 20,3 a cada 100 mil habitantes – crescimento de 11%. En quanto só no Paraná a frota de veículos subiu muito mais em um curto período de tempo: o aumento foi de 35% entre janeiro de 2007 e julho de 2010, saltando de 3,7 milhões para quase 5 milhões de automóveis. Esse cenário se repete em todo o Brasil.
Causas
Entre especialistas, o mau comportamento é apontado como responsável pelas ocorrências e consequentes óbitos, sobretudo de pedestres. Indicar, no entanto, os motivos que levam os motoristas e transeuntes a desrespeitar as leis não é tão simples.
Não são os carros ou as estradas os responsáveis pelos acidentes: nove em cada dez atropelamentos ou colisões são causados por erros dos motoristas, segundo as estatísticas do Detran-PR. “Costumamos dizer que o acidente é uma infração que não deu certo”, afirma a coordenadora de Educação para o Trânsito do Detran-PR, Maria Helena Gusso Mattos.
A diretora de trânsito de Curitiba, Rosângela Battistella, analisa que muitos condutores encontram na direção uma válvula de escape para enfrentar seus problemas. “Às vezes, uma pessoa calma e serena não consegue lidar com o trânsito e não percebe que o carro é uma arma”, opina.
Segundo a psicóloga especialista em trânsito Adriane Picchet to Machado, estudos psicológicos mostram que, quando não se sentem em perigo, as pessoas se descuidam e esquecem de dar atenção à própria segurança. Outros dois fatores que favorecem o cometimento de infrações são o anonimato do motorista e a relação de poder dele com a máquina. “É como se o condutor tivesse no trânsito a possibilidade de cometer erros sem se revelar, ainda mais com vidros escuros”, diz.
Educação e fiscalização
A solução, então, para os problemas vividos no trânsito passa necessariamente pela educação do motorista, o que acontece com conscientização ou fiscalização. As câmeras e radares no trânsito evitam ocorrências, por exemplo. “Quanto mais vigilância, mais as pessoas são forçadas a andar nos limites”, diz o engenheiro elétrico especialista em trânsito e diretor de Negócios Internacionais da Perkons, José Mario de Andrade.
Na avaliação de Maria He lena, a mudança de comportamento ocorre de forma gradativa, com a conscientização por meio de campanhas e fiscalização. Enquanto isso, a fiscalização se transforma em meio de ensinar.
Para educar desde cedo, há quem defenda a inclusão da disciplina sobre trânsito na escola ou a inserção do trânsito no currículo escolar. Conforme o Denatran, o Ministério da Edu cação trata o trânsito como tema universal e não disciplina obrigatória. Por isso fica a critério das escolas decidirem se tratam do assunto, seguindo normas estabelecidas pelo Contran.
Parentes de vítimas ficam com sensação de impunidade
Para quem perde alguém no trânsito, a sensação, muitas vezes, é de impunidade. A maior parte dos homicídios de trânsito, porém, são considerados culposos (quando não existe a intenção de matar). Apenas em exceções o condutor é indiciado pelo dolo eventual (quando assume o risco de matar). “Nos homicídios comuns, há a intenção de matar. Tradicional mente, no trânsito, você não encontra a pessoa que joga o carro em cima de alguém para cometer homicídio”, esclarece Marcelo Araújo, presidente da Comissão de Trânsito da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Paraná (OAB-PR).
Falta consciência
Na maior parte dos acidentes, a imprudência, a negligência ou a imperícia estiveram presentes. Isso acontece, na avaliação de Araújo, não pela falta de punição, mas pela falta de consciência de condutores e pedestres. “Isso só vai acontecer com o trabalho de base, focando em comportamento”, diz. Essa batalha precisa ser encampada pela sociedade: “Por que ninguém mais fuma em vários lugares? Alguém sabe o valor da multa por fumar em lugar público? A própria sociedade impôs esse comportamento e precisa fazer o mesmo com o trânsito”, diz.
No alvo, as mortes no trânsito
Ao lado de Palmas, Belo Hori zonte, Campo Grande e Teresina, Curitiba é uma das cinco cidades selecionadas pela Organização Mundial de Saúde e Fundação Bloomberg para integrar o projeto Vida no Trânsito, cujo objetivo é diminuir as mortes nas ruas a partir do ano que vem até 2020. Para isso, a fundação vai destinar verbas para prestar consultoria aos municípios. O diretor de Promoção à Saúde da Secretaria Municipal de Saúde, Antonio Silveira Filho, afirma que Curitiba foi escolhida pelo programa com o intuito de melhorar as ações intersetoriais com o estado e o governo federal. “Curi tiba é reconhecida pela boa análise de dados do trânsito, com a produção de boletins epidemiológicos. Também é notória pelas garantias de melhoria da mobilidade urbana”, diz. Além do Brasil, outras nove nações foram selecionadas para participar do projeto: Rússia, Turquia, China, Camboja, Egito, Índia, Quênia, México e Vietnã.
Estatística
Apesar dos 30,4 mortos a cada 100 mil habitantes, o Paraná, especialmente Curitiba, tem controle maior dos acidentes e mortes ocorridos no trânsito. “Pode ser que, em outros estados, as pessoas estejam morrendo mais, mas não há informação”, avalia Rosângela Battis tella, diretora de Trânsito de Curitiba
Depoimento
“Ela morreu de forma estúpida”
Mônica Cristina Bonetto Santos, dona de casa que teve a mãe atropelada na calçada, em janeiro deste ano.
Foi em uma manhã de sábado que a dor da perda e humilhação invadiu meu lar [quando a mãe de Mônica, Sueli, 54 anos, foi atropelada na calçada às 9 horas da manhã por uma motorista bêbada]. Nossas leis brandas dizem ser uma fatalidade, um homicídio culposo [quando a pessoa não tem intenção de matar]. Qual intenção, então, teria alguém que pega a direção de um automóvel sem saber dirigir e embriagada?
A partir do momento que você infringe as leis, você deve ser responsabilizado por seus atos. Até quando teremos que enterrar pessoas que amamos por culpa de pessoas que não têm respeito à vida? Que direito de Justiça tem uma família destruída por uma atitude dessa? Infelizmente, nenhum.
2010 é ano de eleições. Está aí uma oportunidade para os candidatos realmente fazerem algo, porque no Brasil muito se fala e pouco se faz. A lei seca absolve quem refuta o bafômetro. O que esperar de leis assim? Minha mãe, uma mulher que lutava todos os dias pela vida [fazia hemodiálise], se foi de uma forma estúpida. Nunca pensei que isso fosse acontecer comigo. Peço a todos que se conscientizem: quando for dirigir, perceba que o carro não é só um meio de transporte e sim uma arma potencial, que tem tirado a vida de muitos inocentes.
Nenhum comentário:
Postar um comentário